Quadrinhos: instrumento pedagógico ou folga
para o professor?
por Wally Silva

Foi-se o tempo em que revistas em quadrinhos eram consideradas um
veneno para as mentes dos jovens e adolescentes. A notoriedade como meio
de comunicação e sua atratividade aos jovens fez com que os educadores
enxergassem nos quadrinhos grandes possibilidades quando usados em sala
de aula. Muitos professores, de fato, reconhecem o mérito e as vantagens
de trabalhar o conteúdo de suas aulas associado à linguagem dos
quadrinhos, qualquer que seja a disciplina.
Cabe, porém, um questionamento: o resultado é satisfatório? Ou
ainda: foi explorado todo potencial dos quadrinhos ou dos alunos? Ou foi
somente uma folga para o professor?
O primeiro questionamento feito por alguns professores é o de que
o jovem não gosta de ler. O que é uma meia verdade. Como assim? É
notório que a maior parte dos jovens tem outros interesses fora da
escola. Revistas adolescentes, quadrinhos, bate-papo na internet,
comunidades virtuais, o recebimento de piadas por e-mail... mas o que
eles fazem com tudo isso? O óbvio: lêem.
A questão não é não ler ou ler pouco. A questão é que geralmente
os textos de sala de aula não são atraentes. Não há identificação com o
leitor. O jovem lê seus recados em um site de relacionamentos porque
está na sua linguagem. Que estudante seria atraído hoje por uma história
de Machado de Assis? Não é para ele uma linguagem interessante. É algo
forçado e penoso. É necessário, para incentivar o gosto pela leitura,
fazer uso das outras mídias contemporâneas a realidade do
aluno.
Segunda questão pontuada principalmente por professores da rede
pública: Não dispor de material. Embora não se possa ensinar quadrinhos
sem exemplos, não é necessário que o professor tenha que distribuir para
cada aluno uma revista atual. Sebos vendem revistas velhas (não
confundir com itens de colecionadores) até por um ou dois reais. Nesse
caso nem mesmo a questão de muitos jovens preferirem gastar R$ 10 em um
CD de jogo “pirata” ao invés comprar uma revista de R$ 6,50 se torna
empecilho.
Embora a quantidade e a diversidade de estilos -do clássico ao
moderno - tenha um bom efeito ao se apresentar os quadrinhos como arte,
dificilmente um professor poderá bancar essa despesa e muitas escolas
sequer cogitarão a hipótese de uma “gibiteca”. Em última instância uma
possibilidade é a de trabalhar com cópias de páginas de revistas ou
imagens através de retro-projetor ou data-show usadas como incentivo à
discussão sobre o tema apresentado ou mesmo à produção de quadrinhos
pelos próprios alunos.
Um exemplo simples e eficiente é o dos professores Francisco
Caruso, Mirian de Carvalho e Maria Cristina Silveira, que coordenam o
projeto EDUHQ, que dentre muitas atividades realiza oficinas com alunos
do Ensino Médio de escolas públicas, onde eles produzem tiras sobre meio
ambiente, física e química.
E o exemplo do EDUHQ não é um caso isolado, basta uma pesquisa na
internet para se achar vários professores e também desenhistas que
utilizam os quadrinhos de uma forma consciente que explora boa parte do
potencial artístico, comunicativo e intelectual de jovens e
adolescentes.
Existem muitas experiências bem sucedidas com os quadrinhos,
principalmente no ensino fundamental, onde a identificação dos alunos
com os quadrinhos pôde render frutos que ultrapassaram a sala de aula,
como no caso de um CIEP na região de Guaratiba-RJ onde os alunos criaram
várias páginas de quadrinhos após uma pesquisa sobre a história da
região. Na maior parte das vezes os melhores resultados são de
professores que conhecem bastante de quadrinhos por afinidade. Mas mesmo
sem um conhecimento anterior ao exercício do magistério é possível ter
um bom aproveitamento dos quadrinhos nas salas? Sim. Basta buscar o
conhecimento especifico sobre os quadrinhos. Somente o conhecimento
empírico, ou de um leitor esporádico, podem trazer dificuldades na
prática em sala de aula.
O potencial da mídia quadrinhos na sala de aula é imenso. Cabe ao
educador conhecer o meio e usar a criatividade.
Esse texto faz parte do nosso Ciclo Científico, com a proposta de
divulgar a produção cietífica sobre quadrinhos em seus mais diversos
aspectos. Se você também é pesquisador, mande seu texto para nós.