Educação Através de Histórias em Quadrinhos

Nova Democracia, ano I, nº 9

 
 

A propósito da didática em matemática

Rosa Minine

A abstração em matemática

“O conceito de motivação é revisto e enfatizado seu papel e importância no processo de aprendizagem. Estamos realmente convencidos de que a motivação é extremamente relevante para o sucesso do processo de aprendizagem escolar, porque estar motivado significa ter prazer em fazer algo e prazer é o estímulo da vida”, é o que afirma a professora Maria Cristina Silveira de Freitas. Atuando como orientadora pedagógica no Colégio Estadual Marechal João Baptista, em Acari, no Rio de Janeiro, e secretariando o “SBPC vai a escola” – um projeto da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência que leva pesquisadores de várias áreas às escolas -, a professora desenvolveu, no segundo semestre de 2002, uma pesquisa sobre a importância da motivação na educação.

A base da pesquisa foi um questionário aplicado a 60 alunos do ensino médio em escolas públicas, divididos em dois grupos de 30, sendo que um dos grupos participa de um projeto interdisciplinar, chamado Eduhq, que visa motivar o aluno a desenvolver sua capacidade de raciocínio criando um pensamento crítico e ao mesmo tempo facilitando a aprendizagem, enquanto o outro participa apenas das aulas tradicionais em sala de aula. Vale lembrar que o questionário foi preenchido individualmente e sem interferência da professora ou qualquer outra pessoa.

O grande diferencial entre os grupos apareceu principalmente em uma questão que pedia para relacionarem as matérias favoritas. Neste caso, o grupo tradicional marcou educação física e artística e outras das áreas humanas, enquanto o da oficina escolheu física e química, demonstrando, segundo Cristina, uma maior facilidade no aprendizado de disciplinas consideradas difíceis para a maior parte dos alunos de ensino médio.

Conforme Cristina, é fato que a maioria desses alunos têm dificuldade nos conteúdos de física, química e matemática, chegando a manifestar, muitas vezes, medo de enfrentá-las. Essa postura mexe com sua motivação para o estudo, reduzindo-a consideravelmente e fazendo com que não alcancem, na grande maioria das vezes, um rendimento satisfatório.

A prova disso é o resultado da fase discursiva do vestibular da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), no biênio 2001-2002, em que os piores desempenhos médios foram, exatamente, as matérias de física, química e matemática. “O ponto essencial da dificuldade é, em nossa opinião, a abstração. A matemática é a disciplina que requer maior grau de abstração e, por sua vez, a física e a química são duas ciências que dependem fortemente do raciocínio matemático. Já a biologia, por exemplo, embora pertencendo ao grupo das disciplinas de ciências da natureza, depende muito pouco deste tipo de raciocínio”.

O projeto Eduhq foi criado em novembro de 2001, pelo físico de partículas, pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e professor na Uerj, Francisco Caruso. Funciona dentro da Uerj, e tem a participação do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, Espaço Ciência da UFF (Universidade Federal Fluminense), Museu de Astronomia e Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), escolas públicas, pesquisadores e professores, que explicam os principais conceitos de todas as áreas do saber através de desenhos em quadrinhos.

Conforme matéria publicada em AND no. 2, o método é simples: após aprender um conceito de física, química, matemática, biologia e outras, o aluno passa para o desenho em forma de tirinha, geralmente de forma bem humorada e crítica. Depois, essas tirinhas vão para escolas públicas para serem usadas como material didático que facilitará o aprendizado de muitas outras crianças.

“O participante não é apenas um desenhista ou alguém que decora algo, já que cria e transforma o conhecimento, e essa é a marca do projeto. Acredito que esse tipo de trabalho deve se tornar parte integrante do ensino no Brasil, porque contribui para uma formação científica e um tipo de raciocínio mais abstrato, físico e lógico. Afora a conversa informal com os professores, os alunos participam de palestras e idas a centros culturais, porque além de passarmos conteúdo, queremos construir um cidadão diferente, alguém que valorize o bonito, a arte e se preocupe com o outro. Essas são, na verdade, ferramentas que vão ajudá-los a mudar o modo de encarar os estudos”, explica Francisco Caruso.

Um ponto fundamental, segundo Cristina, é considerar o papel motivador do material didático, adequando-o às especificações e necessidades do aluno. Uma forma de valorizar as experiências que ele traz de sua vida extra-escolar, viabilizando uma metodologia que estimule sua criatividade.

Para ela, iniciativas como a oficina Eduhq são possíveis de serem reproduzidas dentro das escolas, mesmo prescindindo dos pesquisadores num primeiro momento, já que elas possuem os demais elementos para isso. “Valorizar a igualdade de condições e reciprocidade que caracterizam o diálogo entre professor e aluno, assim como o contato informal com os educadores, num clima de camaradagem entre ‘professor’ e ‘aprendiz’, leva a uma aprendizagem mais significativa e duradoura, capaz de provocar mudanças, para as quais a escola deve estar aberta. O contato com os pesquisadores traz o aluno para mais perto da ciência, percebendo os conteúdos de sala de aula, não como coisas desconexas da vida, mas como parte dela.”

Matéria publicada em Maio de 2003, no jornal A Nova Democracia.

 

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