Educação Através de Histórias em Quadrinhos
 

2 - A RELAÇÃO PROFESSOR x ALUNO E A MOTIVAÇÃO

O professor afeta a eternidade;
Ele não pode dizer onde
Sua influência acaba.

Henry Brooks Adam
[Apud KNOWLES, 1998]

2.1 - Da relação

Ao falarmos em motivação no processo de aprendizagem escolar, é extremamente relevante salientar a relação professor x aluno, pois o modo como esse relacionamento se dá vai dimensionar e direcionar a questão da motivação.

Um professor, consciente de seu papel, sabe que sua tarefa é orientar o aluno em seu aprendizado, tornando-o mais crítico, buscando sempre seu êxito e não seu fracasso. Sua relação com os alunos é uma relação profissional, que deve potencializar o aprendizado amplo, isto é, de conteúdo moral, ético, estético e outros, que inevitavelmente permeiam as aulas, ou como temas transversais, ou como assuntos que transcendam os currículos.

Referindo-se à motivação em sala de aula, Tapia & Fita (1999, p. 107) escrevem: “(...) é necessário que o professor transmita valores de forma explícita. Devemos lutar contra a tendência de deixar isso exclusivamente nas mãos dos ‘especialistas’, professores de religião, ética. Essa tarefa deve ser assumida por todos os professores”.

Por outro lado, segundo Paulo Freire, não se pode conseguir que o aluno passe da ingenuidade intelectual à criticidade, prescindindo de uma formação ética aliada à estética (FREIRE, 2002, p. 36). Isso deve interessá-lo pelo menos tanto quanto interessa ao vendedor que visa não só não espantar seus clientes, mas até fazer com que comprem e levem mais do que tinham a intenção de comprar (MORALES, 1998, p. 13).

O professor é um profissional como outro qualquer (do ponto de vista meramente trabalhista), mas tem uma função, uma “missão” que é o seu diferencial: ele exerce grande influência sobre a formação da personalidade e do caráter de seus alunos. Seu modo de lidar com eles, de interagir com a turma durante as aulas, vai transmitir-lhes muito mais do que o simples conteúdo das disciplinas e pode deixar marcas para o resto de suas vidas. Essas marcas podem ter um cunho positivo ou negativo.

“O professor autoritário, o professor licencioso, o professor competente, sério, o professor incompetente, irresponsável, o professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal-amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático, racionalista, nenhum desses passa pelos alunos sem deixar sua marca” (FREIRE, 2002, p. 73).

O professor (conscientemente ou não) transmite valores, princípios, direciona a atenção do aluno para seus pontos de vista, suas preferências e opiniões. Na verdade, ele é um formador de opinião e esse é o lado político da educação.

O modo de lidar com a turma vai se refletir também na aceitação ou na rejeição da própria disciplina. Por exemplo, professores de Matemática, Física e Química tendem a ser os menos queridos entre os alunos, como temos visto a partir da nossa experiência como orientadora pedagógica.

Como já mencionamos, o aluno sente dificuldade em lidar com essas disciplinas que exigem um alto grau de abstração, que requerem um esforço mental e grande concentração, além do “trabalho braçal” de calcular, calcular e calcular. Começa então a antipatizar-se com as mesmas e também com os professores, por conta disso. Os dias das tais aulas são dias de queixas e reclamações, que acabam canalizadas para a pessoa do professor.

Quando o professor de alguma das supracitadas disciplinas tem um bom trânsito com os alunos, é notório que os mesmos queixam-se menos das aulas e até se interessam mais em aprender, como observamos ao longo de toda nossa experiência em diferentes escolas. Isto se dá com todas as disciplinas, o que comprova o quão importante é o bom relacionamento entre professores e alunos. Dessa forma, a boa relação entre professores e alunos já é um fator de motivação.

Se o aluno não se interessa pela disciplina – seja pela pessoa do professor ou pela exposição das aulas – ele sente grande dificuldade em aprender e esta dificuldade o desmotiva. Seu desinteresse e a sua repulsa pela matéria, e até pela pessoa do professor, crescem. Acaba por se criar um ciclo vicioso envolvendo a desmotivação e o não-aprendizado, o que é difícil de se romper.

O problema maior dessa situação é que o aluno pode levar algumas deficiências de conteúdo por toda sua vida escolar, dificultando também a assimilação de novos conteúdos por conta dessa deficiência. Como as disciplinas não são isoladas, mas, ao contrário, estão cada vez mais interligadas, essas dificuldades e deficiências irão se refletir em outras áreas de sua vida acadêmica.

Quanto maior for a afinidade entre professores e alunos, melhor será a fluência do processo ensino–aprendizagem, pois mais facilmente os alunos compreenderão o sentido de estudar o que está sendo apresentado pelo professor e terão a curiosidade de buscar novas informações que possam complementar a aula, tornando-a um momento de aprendizagem dinâmica para ambos, aluno e professor. Para Carl Rogers, “a aprendizagem auto-iniciada que envolve toda a pessoa do aprendiz – seus sentimentos tanto quanto sua inteligência – é a mais durável e impregnante” (ROGES, 1978). Além disso, há que se considerar que “a relação entre professores e alunos deve ser uma relação dinâmica, como toda e qualquer relação entre seres humanos. Na sala de aula, os alunos não deixam de ser pessoas para transformar-se em coisas, em objetos, que o professor pode manipular, jogar de um lado para o outro. O aluno não é um depósito de conhecimentos memorizados que não entende, como um fichário ou uma gaveta. O aluno é capaz de pensar, de refletir, discutir, ter opiniões, participar, decidir o que quer e o que não quer. O aluno é gente, é ser humano, assim como o professor.” (PILETTI, 1987).

Infelizmente, ainda hoje, em meio a tantas definições e tantos comentários enfáticos sobre o aluno-cidadão, crítico e consciente de sua realidade, este ainda continua sendo um grande desconhecido para o professor. Muitos professores chegam a ponto de achar que as turmas são grupos homogêneos e rotuláveis. Em geral, só conseguem destacar do grupo aqueles mais indisciplinados ou os mais “brilhantes”.

Isso acontece não por descaso do professor, mas pelo fato de que muitos deles – principalmente aqueles que atuam no segundo segmento do Ensino Fundamental e no Ensino Médio – atendem um número muito grande de turmas; alguns chegam mesmo a trabalhar todos os dias da semana, nos turnos da manhã, tarde e noite, ininterruptamente, o que causa um cansaço muito grande, além de um desgaste na própria relação do professor com as turmas. É o que alguns autores chamam de proletarização do magistério. Tragtenberg, por exemplo, afirma que “no seu processo de trabalho, o professor é submetido a uma situação idêntica à do proletário” (TRAGTENBERG, 1985). Atrelada a isso há uma desvalorização social da profissão docente (STEVE, 1995). De fato, é uma grande pena que as condições financeiras obriguem os professores a trabalharem em várias escolas ou até mesmo a exercerem atividades fora do magistério para ter uma vida com um mínimo de dignidade. Este fenômeno dá origem à fragmentação do trabalho do professor, fazendo com que ele se afaste do seu objetivo primeiro: fazer com que o aluno aprenda os conteúdos trabalhados e cresça como pessoa humana. Conforme afirma Steve (1995), “muitos profissionais fazem mal o seu trabalho, menos por incompetência e mais por incapacidade de cumprirem, simultaneamente, um enorme leque de funções”.

Buscando alcançar êxito em sua tarefa de ensinar, o professor, partindo de um programa de disciplina, define os objetivos, seleciona certos conteúdos e alguns métodos a serem utilizados. “Em cada momento deveremos utilizar a metodologia que nos pareça mais direta, mais eficaz ou mais enriquecedora e, sobretudo, mais motivadora”, sustentam Tapia & Fita (1999, p. 111). Porém, o que ele não pode esquecer é que os alunos não são todos iguais; são pessoas singulares, que reagirão distintamente aos objetivos estabelecidos, aos conteúdos e, principalmente, à maneira como o professor se relaciona com a turma. Segundo Bordenave e Pereira (1982, p. 60), “as reações diferentes os levarão a aprender de forma diferente (ou a não aprender)”.

Faz-se então necessário que o professor esteja atento às características de seus alunos, de maneira que possa melhor planejar suas aulas, a fim de atingir o maior número possível de alunos e alcançar sucesso em seus objetivos. Não é aceitável um planejamento sem conhecimento do público alvo. Por esta razão é que muitas escolas estão deixando os planejamentos de curso para depois do início das aulas, para que o professor tenha tempo de conhecer seus alunos e planejar atividades relacionadas com a realidade das turmas, buscando atingir os interesses dos alunos, ou pelo menos se afinar com eles.

Lamentamos que nossas escolas estejam povoadas por profissionais cansados, desanimados, que já desistiram de inovar, temerosos das represálias, das críticas e dos possíveis fracassos. Paulo Freire comenta que “as coisas podem até piorar”, mas nos exorta a “intervir para melhorá-las” (FREIRE, 2002, p. 58). Não podemos aceitar o discurso acomodado de que “não há o que fazer”, conclui o educador. Devemos, sim, ter a ousadia que motiva o ser humano a fazer o novo, a fazer o que ainda não foi experimentado por ninguém. “Toda criação deve superar uma ansiedade. Criar é desatar uma angústia”, afirma Bachelard (BACHELARD, 1990, p. 114). Vencer o medo - principalmente o medo do novo - é o que se espera de um educador capaz de transmitir criticamente o conhecimento, pois, como nos ensina o filósofo francês, “por mais efêmero que seja o medo, está quase sempre na origem de um conhecimento” (BACHELARD, 1990, p. 150). 

2.2 - Dos tipos de professor

Inspirados nos tipos de líderes apresentados no livro de Pierrre Weil (1971), apresentamos três tipos de professores que encontramos com maior freqüência nas salas de aula.Temos certeza que os leitores irão se identificar com algum deles ou associá-los a pessoas conhecidas. Qualquer semelhança terá sido mera... intenção.

Professor autocrático

Figura 2.1. Tirinha produzida por um aluno da Oficina EDUHQ, que faz parte de uma série dedicada a criticar a Escola e o Sistema Educacional.

O professor autocrático não se importa em saber o que seus alunos pensam. Ele os trata como simples lacaios, dando ordens que devem ser cumpridas sem discussão. É, em geral, uma pessoa irritável, brutal, colérica, egoísta e incapaz de compreender os outros. Não tem, aliás, nenhum interesse para isso.

O professor autocrático ou provoca revolta nos alunos, ou uma passividade completa, levando-os a não querer fazer nada além do proposto. É o tipo de professor que passa muitas atividades, das quais ele se ausenta, para ocupar a turma, afim de não ser incomodado. Procura cumprir rigorosamente o planejamento anual, não se importando se a turma aprendeu ou não. Para ele, bom professor é aquele que cumpre todo o programa, mesmo que superficialmente.

Esse tipo de professor segue a linha pedagógica tradicional. Prega que o professor ensina e o aluno deve aprender. Não há trocas nessa relação. Tão pouco se preocupa com qualquer tipo de motivação, pois, para ele, o aluno tem que estudar por si só, não necessitando de bajulação.

Bate no peito e diz: “Sou professor, não educador, e meu papel é ensinar, dar aulas. Nada mais”. Não há nesse profissional qualquer intenção de se relacionar afetivamente com os alunos.

Professor laissez-faire

Laissez-faire em francês quer dizer deixar fazer. O lema desse professor licencioso é “deixar como está para ver como é que fica”. É uma pessoa muito insegura, que tem receio de assumir responsabilidades. Não dá nenhuma instrução, cada aluno faz o que quer e como bem entende. Na divisão do trabalho, na repartição das responsabilidades, a confusão é completa. A sua aula é cheia de atritos, com grande desordem entre seus alunos.

Esse professor não se preocupa com os conteúdos, tão pouco os ministra de maneira concatenada ou seqüencial. Também não se define por nenhuma linha pedagógica. Costuma ser levado pelos modismos.

Tem até boa intenção em motivar seus alunos, mas, como não programa nem organiza as atividades, elas acabam virando bagunça e perdem o propósito motivacional.

Em geral, esse tipo de professor tem um bom relacionamento com os alunos, porém pode ser desrespeitado por alguns por não se impor como profissional.

Professor democrático

O professor democrático procura concentrar toda a atenção sobre as atitudes e interesses dos alunos, que não são tratados como simples receptores de informações e conhecimentos, mas sim, como colaboradores.

É uma pessoa que procura orientar a aula com a cooperação, a participação espontânea e a boa vontade dos alunos. Respeita o homem e crê nele. Consegue a cooperação do grupo pela sua competência, paciência, tolerância e honestidade de propósitos. Não dá ordens; dá o exemplo, estimulando em vez de ralhar.

Toda a sua atenção está concentrada no que o aluno pensa. Ele sabe obter o máximo de produtividade através do máximo de boa vontade. Faz um apanhado das diversas correntes pedagógicas, dosando muito bem o melhor de cada uma delas, procurando acertar mais do que errar. 

Como Vigotsky apresenta, esse tipo de professor é um entusiasta e, tal como Piaget concebe, sabe a importância de manter a turma motivada para obter sucesso no processo de aprendizagem dos alunos, por isso, faz uso de todos os recursos disponíveis para motivá-los.

Em geral, esse tipo de professor tem um ótimo relacionamento com os aluno e é por eles muito respeitado.Usa sua autoridade sem autoritarismo.

 

 

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