Educação Através de Histórias em Quadrinhos

Introdução ao Projeto

 
 

Desde os pré-socráticos, é possível encontrar no pensamento filosófico reflexões sobre a arte ou sobre o belo, do ponto de vista do conhecimento sensível, até chegar-se ao século XX, quando tais reflexões se desdobram, definindo propostas no campo da Educação: nesse momento, explicitamente, surgiram perspectivas pedagógicas que abordaram a relação arte/educação. Tais perspectivas centralizaram a criatividade como ponto fundamental nos processos didático-pedagógicos, valorizando a importância da arte para o desenvolvimento de outras realizações do homem. Por outro lado, é inegável o papel central da criatividade no desenvolvimento da Ciência. Assim, é possível e importante pensar-se, a partir da filosofia bachelardiana, um projeto pedagógico transformador, renovando o ensino das ciências através da arte, que enfatize essa dimensão maior do pensamento criativo para o homem.

Desenvolvendo uma filosofia de grande importância para o século XX, com desdobramentos possíveis e importantes ainda hoje, Gaston Bachelard ampliou os campos da Epistemologia e da Estética, instaurando novas idéias que revolucionaram a crítica literária e a crítica de arte, bem como a pedagogia das ciências, com alcance mais amplo.

Bachelard - do ponto de vista filosófico - ganha papel primordial quanto à questão da importância da poesia e das artes na pedagogia, não como meios ou instrumentos didáticos, mas dando-lhes autonomia, e estudando-as como processo criativo, como poéticas. Com esta proposta, ele valoriza o homem em uma sociedade produzindo ciência, tecnologia e poesia, conferindo-lhes igual valor na criação de um pensamento, ao mesmo tempo racional e imaginativo, capaz de produzir mudanças no conhecimento e no próprio homem. Razão e imaginação, imbricadas, respectivamente, na Ciência e na Poética, completam-se. Vendo esta última como instância fundamental da imaginação da matéria e das coisas, ele estende à arte a dinâmica desse processo. Embora as artes, como produto cultural, se cristalizem no plano sensível através da matéria e da técnica, e a ciência - no plano de pensamento formal - desconstrua a natureza e construa outros fenômenos - , é preciso não perder de vista que ambas advêm de uma criatividade transformadora. Para Bachelard - deve-se enfatizar - a arte, como vertente poética, funda-se nos processos imaginativos e no trabalho da matéria, retomando sempre o imaginativo através do espectador ativo. Já a ciência cria fenômenos a serem estudados muito além do plano empírico, construindo universos formais. Mas ambas tangenciam uma metafísica e demandam trabalho, para alcançar suas metas. Nada nos é dado no plano da ciência e da arte: tudo se fabrica. Tudo se cria. Porém, para Bachelard, "não criamos com idéias ensinadas", ou seja, não criamos com idéias reproduzidas ou a partir da tradição. Criamos, assim como o artesão trabalha o barro: transformando a matéria e, ao mesmo tempo, transformando-se.

Seguindo tais princípios, em uma de suas obras (Cf. L’Intuition de l’Instant), Bachelard esboça uma concepção antropológico-filosófica, afirmando a importância da relação entre ciência e poética, entre ciência e arte, podemos assim dizer, para o crescimento do homem como indivíduo e como pessoa, na vida social.

Criador de um pensamento filosófico, implicitamente pedagógico, que valoriza a perspectiva e a necessidade das transformações e mudanças da razão científica através da história, para Bachelard o conhecer é sempre ruptura com a tradição, uma ruptura nomeada por seus comentaristas de corte epistemológico, capaz de criar outros modos e possibilidades de pensar e imaginar o mundo, e outra linguagem para descrever e conceituar o mundo. É importante notar que a noção de corte epistemológico é uma noção dinâmica, que se completa e se amplia em outras, como as de obstáculo epistemológico, conhecimento aproximado e retificação do conhecimento. O ato criativo e a dinâmica articuladora da ciência, da poética e das artes situam-se, deste modo, no centro da pedagogia bachelardiana.

Contemporâneo do Surrealismo, da Teoria da Relatividade e da Física Quântica, a partir deles, Bachelard elaborou sua filosofia da ciência e das artes, partindo da imaginação criadora - intrínseca aos processos do fazer e da fruição artística - enfatizando a poética do mundo e da matéria como instância provocadora, que pode tornar-se poesia, arte, corpúsculo ou onda. Bachelard estuda as transformações da noção de matéria, vendo-a como fulcro dos processos criativos da razão, na ciência, e das imagens, na poesia e nas artes. Transformar o conhecimento, o homem e o próprio mundo através dos atos de conhecer e de imaginar são ideais bachelardianos, que fundamentam este projeto.

 

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