GRAVITAÇÃO E COSMOLOGIA

A Teoria da Relatividade Geral (TRG) é considerada por muitos o maior triunfo da racionalidade científica. Na elegância de seus conceitos e equações estão contidas descrições precisas de fenômenos simples, como a queda de uma maçã, ou complexos, como a descrição da dinâmica de pulsares binários e do próprio Universo, satisfazendo todas as observações e experimentos até hoje propostos para testá-la. Entretanto, muitas de suas consequências ainda não foram observadas com rigor (como, por exemplo, ondas gravitacionais), além de existirem algumas situações críticas onde a TRG parece não ser aplicável, necessitando de modificações ou generalizações. Tais situações são:
 

            a Estágio final de determinadas evoluções estelares

      Sabe-se que para estrelas com massas superiores a uma determinada massa crítica, o colapso gravitacional é inevitável, levando à formação dos chamados buracos negros, regiões localizadas no Universo de onde nenhuma informação pode escapar. Segundo a TRG, no interior destes objetos existe uma singularidade onde nenhuma física é possível. Ademais, eles emitem uma determinada radiação de origem quântica que vai pouco a pouco consumindo sua energia. O estágio final desta evolução é desconhecido. Relacionados aos buracos negros estão os chamados buracos de minhoca, cuja física ainda é especulativa e com propriedades intrigantes (possibilidade de rápidas viagens inter-estelares, formação de curvas tipo-tempo fechadas).

      b Cosmologia primordial.

A cosmologia primordial constituía, há algumas décadas, um campo extremamente especulativo. Esta situação mudou radicalmente nos últimos anos. A abundância de elementos químicos leves permite testar os modelos cosmológicos até aproximadamente t » 10 - 4 s. Por outro lado, a análise da anisotropia na radiação cósmica de fundo pode nos dar acesso observacional a épocas muito remotas, visto que ela permitiria obter informações sobre os processos químicos responsáveis pelas flutuações que originaram posteriormente as estruturas em larga escala.

Entretanto, existem, ainda assim, falhas fundamentais no modelo cosmológico padrão que requerem estudos das teorias fundamentais nos primeiros instantes da história do Universo. São elas basicamente:

O problema da singularidade transformou-se, ao longo da década de 70, na grande questão da Cosmologia. A hipótese da existência de uma tal singularidade, há um tempo finito de nossa época, possuía uma consequência desagradável: a de que não seria possível conhecermos os dados iniciais do Universo. Isto limitaria a possibilidade de obter-se uma descrição cosmológica completa similar ao que ocorre com os buracos negros. Em um primeiro momento, a existência de uma singularidade primordial foi considerada como um dado definitivo, graças ao elevado status adqüirido por uma série de teoremas. Estes últimos, demonstrados no âmbito da Relatividade Geral, pareciam mostrar a impossibilidade da Física Clássica em produzir configurações gravitacionais não-singulares. Esta foi a principal razão para que os aspectos quânticos em Cosmologia passassem a ser mais cuidadosamente examinados. Entretanto, ao longo dos anos 80, diferentes abordagens - concebidas em áreas como Termodinâmica fora do equilíbrio ou outras abordagens envolvendo formas diferentes de acoplamento de campos de matéria com a gravitação - produziram alternativas eficazes para a solução deste problema, ao gerarem soluções cosmológicas não-singulares. Estes resultados deram origem a uma nova e profunda linha de investigação das propriedades do Universo em sua fase extremamente condensada mas não-singular.

A compatibilização entre a alta taxa de isotropia inferida da detecção da radiação térmica de 2,7K (observada desde 1964) e a causalidade em um Universo de tipo Friedmann, com seção espacial homogênea (o qual seria o modelo de geometria correntemente aceito para descrever o Universo) constitui-se em uma tarefa difícil. Nos anos 70, a Escola Russa (representada por Lifshitz, Khalatnikov, Belinski, e outros) deu início a um programa de ataque direto a esta questão. Embora tenham realizado várias e importantes contribuições, não foram estas suficientes para resolver completamente a questão. Na década de 80, a proposta de um modelo de Universo inflacionário surgiu como um substituto ao programa russo. Não obstante uma quantidade notável de publicações e malgrado o otimismo inicial, esta proposta continua incompleta nos seus fundamentos básicos. As características de uma possível fase anisotrópica inicial do Universo vêm sendo examinadas e mecanismos de isotropização continuam a ser investigados. Uma das questões mais complexas que a comunidade dos físicos e astrônomos tem enfrentado é a da compatibilidade entre um modelo ideal do tipo Friedmann (possuindo uma seção espacial homogênea) com as observações astronômicas que apontam a existência de diferentes escalas de heterogeneidades no Universo. Alguns modelos para a formação das estruturas nele observadas - galáxias, aglomerados de galáxias - requerem a ocorrência de pequenas perturbações em uma fase dita primordial do Universo, onde a estrutura geométrica deste é controlada quer por radiação em equilíbrio térmico, quer por matéria dita exótica. Isto ocorre, por exemplo, no chamado modelo inflacionário. Em um tal modelo, pequenas perturbações iniciais são amplificadas graças à instabilidade gravitacional, gerando assim estruturas hoje observadas. Estas alterações iniciais seriam determinadas - de acordo com diferentes modelos - pela física de interações de curto alcance a altas energias. Deste modo, estabelece-se um forte compromisso entre a Teoria Quântica de Campos e a Física de Altas Energias de um lado e a Teoria da Gravitação por outro. Nas duas últimas décadas houve um grande avanço na obtenção de dados astronômicos extra-galáticos, obtidos com uma boa precisão. A análise da produção destas estruturas, a partir dos dados iniciais fornecidos pelas perturbações ganhou, portanto, um enorme impulso. Como consequência, fenômenos de altas energias - bem como as teorias que os descrevem - passaram a ser investigados com maior rigor e consequência científica, saindo de um terreno puramente especulativo para o confronto com observações cada vez mais precisas. Para tratar estes problemas, torna-se necessário formular um modelo aplicável ao Universo em seus primeiros instantes.